27/05/08

fernanda câncio

Gosto desta senhora. Merece um copy-paste.

"O petróleo aumenta, aumenta, aumenta. Motivos múltiplos, alguns mais perceptíveis que outros. Mas vai dar no mesmo, qualquer que seja o motivo: os países que o têm passam bem e os que não têm passam mal. E passam tanto pior quanto mais dependem dele. E é espantoso o quanto dependemos, nós os sem-petróleo, do petróleo que não temos. Não só dependemos como queremos continuar a depender. Nem sonhamos outra coisa. É assim uma espécie de estado de negação permanente, uma patologia psíquica global.

Comecemos por um exemplo fácil. Temos os taxistas e as transportadoras em pé de guerra a exigir “gasóleo subsidiado”. Parece que o Estado (isto é, eu, quem me lê e quem não me lê) subsidia o gasóleo para uso agrícola e eles querem o mesmo tratamento. Não querendo perder muito tempo com o subsídio para a agricultura - faz parte de um mundo hipersubsidiado que sempre tive a maior dificuldade em entender -, fico de boca aberta ante a exigência. Por que carga de água hei-de eu, com os meus impostos, subsidiar o combustível que alimenta os táxis e os camiões? Para que os táxis não aumentem e as mercadorias não subam de preço devido ao custo acrescido no transporte, respondem-me. E eu respondo de volta: e por que não hão-de as mercadorias ser transportadas de comboio e de barco, meios que têm um dispêndio inferior de energia? Por que não hão-de os táxis ser reconvertidos para trabalhar a gás, que, ao que ouvi dizer, é coisa que não custa assim tão caro, permitindo usar um combustível que é mais de 50% mais barato e ainda por cima menos poluente? E, não despiciendo, por que há-de quem não usa táxi subsidiar quem usa?


A mesma lógica se aplica aos detentores de automóvel - afinal, ninguém é obrigado a ter carro, e se o tem, estando disposto a fazer face aos acidentes de percurso (a começar pelos propriamente ditos), por que não há-de ver na subida do preço da gasolina e do gasóleo mais um acidente? -, como aos transportes públicos em geral e a toda a gente em particular. Escolha como quer reagir a esta situação: chorando e exigindo “apoios” ou aproveitando para mudar hábitos, poupando energia e dinheiro? Quantas pessoas há que deixaram de usar transportes públicos há anos, passam horas em bichas e a procurar lugar para estacionar, apenas porque meteram na cabeça que isso é mais cómodo e lhe confere mais statu? Quanta gente há que não dá um passo a pé, para quem é impensável viver num prédio sem elevador e para quem as práticas ambientalmente conscientes são “perdas de tempo” e “esquisitices”?

O papel do Estado é fundamental nesta matéria, é. Mas recusando subsídios e encorajando a reconversão e a poupança energética, a começar pelos transportes públicos. Já fazemos todos parte, quer queiramos quer não, do Movimento dos Sem-Petróleo (MSP). É altura de a ele aderirmos à séria, com entusiasmo e militância."


publicado no DN de 23/05/2008

3 comentários:

Jose Ruah disse...

Sou leitor assiduo do seu blogue.
Gosto do que escreve, e da sua forma de ver as coisas.
Não concordo sempre com o que diz, mas respeito.

Todavia, e entendendo porque o faz, desta vez acho que foi no engano.

Esta senhora jornalista escreve muito bem, é um facto. Mas esta peça está eivada de demagogia barata.

Sabe ela tão bem quanto não o escreve que o gás para automoveis conhecido por GPL e cuja sigla significa - Gás de Petroleo Liquefeito - vem exactamente do Petroleo.

Ou seja mudar para gás não diminui a dependencia do petroleo.

Mudar para gás natural também não. O Gás natural recolhe-se nos poços de petroleo.

É evidente que se pode transportar as mercadorias de Barco e de Comboio. E é isso que acontece. Acredite que sei o que digo pois durante muitos anos da minha vida trabalhei numa empresa de Trading de Cereais e só recebiamos mercadoria em Navio.

Dizia que é evidente o comboio e o navio. O que não é evidente é que cada cidade tenha um porto de mar e que cada freguesia tenha um ramal de caminho de ferro.

Estes dois transportes cumprem a sua função até ao ponto em que é necessário o Camião.
Bem poderiamos voltar ao carro de bois, mas...

No meio de tudo apenas concordo que a actividade economica nao pode ser subsidio dependente.

E por fim deixe-me acrescentar o que a dita jornalista não disse.

Podemos ser todos militantes anti petroleo. Nao consumimos mais.
Passamos a andar a pé, transportar as coisas em jangadas e em carros de bois.

Mas também deixamos de ter internet, bem nao a internet mas a electricidade que permite que a tenhamos.

Pois é , é que mais de 50% da electricidade que gastamos vem da queima de petroleo.

E as alternativas são:
a)Plantar moinhos de vento(dos modernos) para a energia eolica - de acordo com varios estudos não temos em Portugal terreno suficiente para produzir tudo o que precisamos.

b) Plantarmos 2 ou 3 centrais nucleares para produçao de energia.

c) Energia das ondas ( uma miragem) e biomassa (outra miragem)


Sabe com Demagogia passamos a nao consumidores de petroleo num apice.


Aceite o meu agradecimento por escrever e por trazer este tipo de temas ao seu forum.

calvinn disse...

Eu tenho uma frase que diz que a vida, toda ela é feita de ciclos.O que no passado se fez e se esqueceu, volta anos mais tarde, da mesma forma para nos relembrar que controlamos tudo à nossa volta até que alguém se lembre de quebrar a rotina. Pois bem, o preço do Petróleo aumentou. Mais tarde ou mais cedo isso iria acontecer. O preço dos alimentos também aumentou. Bom , mais tarde ou mais cedo isso iria acontecer. Os senhores taxistas e pescadores e donos de transportadores e agricultores , este e aquele também querem ajuda, mais tarde ou mais cedo isso iria acontecer. Não acho que o texto que a senhora em causa escreveu esteja impregnado de demagogia. Penso que ela escreve com a razão de quem começa a ver o cerco a apertar cada vez mais. Com mais ou menos dificuldade, mais ou menos paciência, mais ou menos "tempos", os mercados e sociedades iram reorganizar-se para fazer face a mais uma "crise" imposta por todos nós. Podemos nos queixar porque faz parte da condição humana, não pudemos é fazê-lo e ficar de braços cruzados. Se todos fizermos um bocadinho , esse bocadinho vai influenciar alguém que por sua vez, será obrigado a influenciar outro alguém, formando um "grande comboio" de sucessivos acontecimentos que farão com que tudo volte ao normal. A capacidade que temos em nos adaptar a circunstancias adversas é impressionante. Lembrem-se que já "assistimos" a calamidades bem piores e sobrevivemos.

atentamente
Calvinn

Ines S disse...

precisamos de uma outra revoluçao! :)
greve, bombas de gasolina fechadas, ou gasolina racionda; precisamos de obrigar o povo portugues a pensar em alternativas ao carro. e, aquando ai, eu sou a primeira a pegar no carro para ir a qualquer lado (bom, talvez nao à baixa em dia de semana...). A verdade é que a rede de transportes 'deixa um pouco a desejar'... Onde vivo, mesmo tendo carro, prefiro andar de bicicleta ou metro: nao so é mais rapido, como menos stressante (e com a vantagem de se fazer exercicio). E lembro me de uma greve em que nao havendo transportes nem gasolina, os cidadaos vinham trabalhar de bicicleta, patins, carros partilhados - boleias combinadas -, trotinete, tandem... enfim, nao ha como a necessidade para por o nosso cerebro a pensar em alternativas!
E sim, tambem nao quero pagar um imposto de ajuda à gasolina dos taxis que nao uso por serem luxos, pois o metro em Lisboa é tao bom... (mesmo que nao chegue a todo o lado...)

Estou curiosa... de saber até onde a guerra do petroleo nos vai levar. Curiosa, mas receosa.